sábado, 1 de setembro de 2012

AS PULSÕES E SEUS QUATRO ELEMENTOS



A palavra pulsão é a tradução da palavra alemã Trieb, mas não é a única tradução possível. Alguns tradutores preferem traduzir Trieb por instinto. Todavia, os tradutores partidários do termo pulsão replicam que Freud utiliza Instinkt quando pretende falar de um comportamento animal pré-formado, hereditário e característico de uma espécie. Conforme Freud, não existe a pulsão no singular, mas sim as pulsões, as quais são reunidas em dois grupos, a saber, as pulsões de autoconservação (ou pulsões do eu) e as pulsões sexuais. No tocante às pulsões sexuais ele diz que são inúmeras, surgem de diversas fontes orgânicas e operam a princípio independentemente umas das outras e sua finalidade é o prazer do órgão.
 As pulsões sexuais, a princípio, estribam-se nas pulsões de autoconservação e seguem, para encontrar um objeto. Observe-se que Freud nunca falou de apoio de uma pulsão sobre um instinto. O que ele assegura é de apoio de uma pulsão sexual sobre uma pulsão de autoconservação .  
Segundo Freud as pulsões são  um processo dinâmico consistindo em um impulso que possui sua fonte numa excitação corporal localizada. Esse impulso move o aparelho psíquico, de maneira que seja realizado um comportamento visando descarregar a tensão existente ao nível da fonte corporal.  Portanto, a descarga constitui a finalidade da pulsão. Escreve Freud[1] no segundo capítulo de sua obra Esboço de psicanálise sobre as pulsões (termo este traduzido por instintos pelo tradutor):

“As forças que presumimos existir por detrás das tensões causadas pelas necessidades do id são chamadas instintos. Representam as exigências somáticas que são feitas à mente. Embora sejam a suprema causa de toda a atividade, elas são de natureza conservadora; o estado, seja qual for, que um organismo atingiu dá origem a uma tendência  a restabelecer este estado assim que ele é abandonado.”

 Na sua obra Pulsões e Destinos das Pulsões, de 1915 Freud expõe de maneira sistemática esta sua primeira teoria das pulsões. Define  a pulsão como um conceito de fronteira entre o psíquico e o somático. Conceito fronteiriço  quer dizer simplesmente que se trata de uma estimulação que vem do somático e atinge o psíquico, atravessando, portanto a fronteira entre o soma e o aparelho psíquico. Sigmund Freud afirmou que as pulsões possuem quatro elementos: a pressão, o alvo, o objeto e a fonte.
A pressão é uma energia potencial, algo latente à pulsão, que exerce sua força e é de fato, a sua essência. É mediante esta energia potencial que o aparato psíquico se movimenta. Tal energia potencial impulsiona a psique. Esta energia flui constantemente, é um potencial energético sempre presente e insaciável, por não estar a serviço de nenhuma função biológica, como a fome ou a sede.
O alvo da pulsão é sua satisfação completa, a qual segundo Freud jamais será satisfeita. O máximo que o organismo e a psique podem atingir é uma satisfação parcial da pulsão através de sua descarga por objetos.
O objeto da pulsão pode ser qualquer coisa que permita a descarga parcial da mesma, pois o objeto da pulsão depende da fantasia e do desejo do indivíduo. O objeto da pulsão é aquilo junto a que, ou através de que, a pulsão pode atingir seu alvo. O objeto é variável, e não está intrinsecamente ligado à pulsão. O objeto está ligado à pulsão em consequência de sua potencialidade para tornar possível a satisfação. A variabilidade e contingência dos objetos e alvos das pulsões, por excelência em relação às pulsões sexuais, são cruciais para diferenciar a concepção freudiana da pulsão de outras concepções relacionadas ao conceito de instinto.
Finalmente, a fonte da pulsão é o interior do corpo. Com efeito, a pulsão esta numa posição intermediária entre o corpo e a psique.
 Freud, em sua obra Pulsões e destinos das pulsões  faz a distinção entre pulsões  sexuais e  pulsões do eu, como já enfatizado. Todavia na sua obra Além do princípio de prazer de 1920, Freud postula a existência de uma pulsão de morte contra a qual a pulsão de vida atuaria. Escreve Freud[2]:

“Depois de muito hesitar e vacilar, decidimos presumir a existência de apenas dois instintos básicos (pulsões), Eros e o instinto destrutivo... no caso do instinto destrutivo, podemos supor que seu objetivo final é levar o que é vivo a um estado inorgânico.”


BIBLIOGRAFIA

BRABANT, Georges Philippe. Chaves da psicanálise. Zahar Editores. Rio de janeiro:1973.
FREUD, Sigmund. Além do princípio de prazer. Edição Standard brasileira. Editora Imago. Rio de Janeiro: 2006.
FREUD, Sigmund. Esboço de psicanálise. Editora Imago. Rio de Janeiro: 2001.
GOMES, Gilberto. Os dois conceitos freudianos de Trieb. Psicologia: Teoria e Pesquisa, Vol. 17 n. 3. Brasília: 2001.


[1] Sigmund Freud. Esboço de psicanálise. P. 15.
[2] Sigmund Freud. Esboço de psicanálise. P. 16.

8 comentários:

  1. Sobre os comentários acima (não dando mais valor aos comentários do que o artigo) se faz necessário uma reflexão

    Quando vamos fazer uma leitura sobre o mundo e tudo que nele consta, sem saber (saber não sabido, já dizia Jacques Lacan), temos uma teoria que dá suporte ao nosso discurso. E acreditamos que esta nossa visão de mundo é absoluta, negando as possibilidades de teorias contraditórias coexistirem sem uma anular a outra (ler o matemático brasileiro Newton da Costa e sua teoria paraconscistente). Em relação a isso, podemos mencionar, como exemplo, as teorias da fisica: temos a teoria de Newton (que explica pouca coisas) sobre o universo. Temos a teoria de Einstein que explica o universo de forma macro e a física quântica que explica o universo micro. As três teorias se contratizem, porém nenhuma anula a outra.

    Nesta mesma lógica, poderiamos pensar as ciências humanas. Mas um obstáculo epistemológico existente é essa ilusão absolutista da verdade. E isso aponta para as dificuldades das pessoas pensarem de forma mais ampla. (Saber mais sobre isso assistir YouTube: a topologia de Jacques Lacan de Alfredo Eidelsztein realizado na USP)

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  2. Ajudou muito! Teria como explicar um pouco sobre o destino das pulsões? a reversão ao contrário; o voltar-se contra a própria pessoa; a repressão e a sublimação. Obrigado!

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  3. Muito bomm!!! Obrigada pelo texto!!😉❤

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